segunda-feira, 3 de março de 2008

Um bom e divertido artigo sobre planejamento

Um bom e divertido artigo sobre planejamento

O texto a seguir foi extraído dom site www.marcospontes.net em 16/01/02.

De forma muito engraçada, o autor e astronauta brasileiro Marcos Pontes dá as dicas para se fazer as necessidades básicas no espaço.

Para mim é um grande exemplo de planejamento, contado de forma descontraída
e que nos remete a visualização da situação descrita.

Boa leitura!


"Fazer as necessidades básicas no espaço

O problema é a tal da gravidade! Na verdade, a falta dela. Primeiro, é necessário conectar-se ao vaso. Depois, assegurar-se que “nada” irá retornar ao “local de origem” ou, pior ainda, ficar flutuando indevidamente pela cabine. Realmente, ir ao banheiro no espaço não é simples. Conselho útil: nunca deixar para a última hora!
Na verdade, o procedimento não é complicado. Ainda bem. Mas precisa, como um todo, de um certo planejamento pessoal. Basicamente, a questão se divide em duas partes: como permanecer ligado ao vaso e como fazer para que qualquer material produzido, líquido ou sólido, siga na direção correta. As respostas a esses dois problemas são completamente cobertas pela metodologia do procedimento previsto no “check-list” da espaçonave. Como este é um assunto que aparece com grande freqüência na lista de curiosidades sobre a vida no espaço, vamos falar um pouco sobre como funciona esse sistema no ônibus espacial.
Comecemos com a necessidade de “prender-se” ao vaso. Isso é feito com o auxílio de fitas restritoras equipadas com velcro para segurar os pés. Isto é, na frente do equipamento “WMS”, o “Waste Management System” - vulgarmente conhecido por vaso sanitário, existem dois suportes para os pés. Nas laterais desses suportes temos fitas cobertas com velcro que são ajustadas ao redor de cada pé. Assim, o primeiro passo na preparação para a “atividade” é assegurar-se que existe uma boa fixação dos pés. Depois, uma vez sentado, o firme contato com o vaso é garantido por dois restritores metálicos retráteis. Eles são inicialmente localizados ao lado do assento. Um de cada lado. Para posicioná-los, eles devem ser levantados e girados sobre as coxas do astronauta, quase na altura da cintura. Utilizando molas, esses dispositivos mantêm o tripulante firmemente sentado, sem a necessidade de segurar-se nessa posição durante todo o processo. Não é necessário dizer que, logicamente, nesse passo do procedimento, as roupas já devem estar fora do caminho!
Acabou? Claro que não. Para estar “realmente conectado”, também é preciso cuidar dos líquidos. Afinal, essas coisas, sólidos e líquidos, podem ser processadas ao mesmo tempo ou quase na seqüência!
Inicialmente, é importante ressaltar que cada tripulante tem o seu próprio “adaptador”. É isso mesmo, adaptador! E, assim como escova de dentes, não se empresta esse item tão privado! Para não ter dúvida, cada um tem sua própria cor, individual. O comandante pode ser verde, por exemplo.
O primeiro especialista de missão, azul. E assim por diante. Obviamente, são diferentes também em formato para homens e mulheres, é claro. Simples conseqüência do desenho original da natureza. Muito bem. Conhecidos os adaptadores, vamos para o processo em si. No centro, na parte dianteira do vaso, o sistema possui um tubo para a coleta de urina. Na ponta do tubo encaixamos o adaptador que, por sua vez, é “adaptado no tripulante”. Tudo conectado, tudo checado, estamos completamente prontos para “relaxar” e usar o sistema. Certo? Errado! E a parte do direcionamento dos materiais produzidos? Isso é conseguido através do uso de uma sucção regulada de ar para interior do sistema. O diferencial de pressão é obtido gratuitamente do ambiente exterior, o espaço. Contudo, como nesse ambiente externo a pressão é praticamente nula (quase vácuo), é necessário controlar e reduzir essa diferença de pressão com relação ao ambiente interno da espaçonave. Isto é, deve-se ter apenas uma leve sucção. Afinal, ninguém quer que o tripulante seja “virado no avesso”! Para tanto, existem vários reguladores e válvulas de segurança instalados nessa linha de descompressão. Essa linha é aberta através de uma válvula principal comandada na parte inferior direita do vaso. Portanto, abrir essa válvula é também um passo essencial do procedimento.

Quando a linha é aberta, podemos ouvir da sucção, um som bastante alto, diga-se de passagem, e sentir o fluxo de ar no coletor de sólidos e no tubo para líquidos.
Agora sim, tudo ficou igual a ir ao banheiro aqui na Terra. Sem necessidade de explicações extras. Como auxílio operacional, caso alguma parte do procedimento seja esquecida ou simplesmente para leitura durante o “processo”, o tripulante tem, a sua disposição, um “check-list” que contém a descrição detalhada de todos procedimentos necessários pelo sistema. Ele é fixado com velcro à parede do pequeno banheiro. Ainda, nessa mesma parede, do lado esquerdo, temos os lenços higiênicos para a limpeza pessoal após a atividade. Aliás, os passos para finalizar o procedimento são, basicamente, o caminho inverso do que foi feito anteriormente. Primeiro, a válvula de sucção é desligada. Depois, o tubo de coleta de líquidos é desconectado. Para possibilitar a limpeza pessoal, solta-se o restritor das coxas. Os lenços utilizados são depositados em um recipiente do lado esquerdo do vaso. Finalmente, soltam-se as fitas restritoras dos pés. Não é necessário dar descarga. A sucção já cuidou de coletar os sólidos e líquidos no local correto no sistema. Nada é lançado ao espaço. Ninguém quer produzir mais lixo espacial! Tudo fica estocado no veículo, em recipientes apropriados, durante toda a missão. Após o pouso esse material é recolhido e descartado pelo pessoal de suporte.
Simples, não é? Mas espere, ainda faltou uma parte importante do sistema para ser descrita. Aliás, uma parte bastante peculiar. O orifício do vaso sanitário, por onde passam os sólidos, tem apenas oito centímetros de diâmetro. Isto é, ele é estreito. Somado a isso, como era de se esperar, dadas as restrições da microgravidade, não existe água de descarga no interior do vaso, como normalmente observamos aqui na Terra.
Como resultado, existe a necessidade de se “alinhar e acertar” corretamente o orifício durante o processo de “produção dos sólidos” para evitar deixar muitos resíduos nas paredes no coletor, visto que o próprio tripulante é responsável pela limpeza posterior do equipamento. Ou seja, é bom não errar o alvo! Para nos auxiliar nessa tarefa de “apontar” corretamente, existe uma câmera instalada dentro do vaso, produzindo imagens que são vistas pelo tripulante, durante o processo, em um monitor colocado na parede esquerda superior do banheiro. Bastante estranho, mas necessário. Realmente, nessa profissão temos que nos conhecer completamente. Algumas vezes até um pouco mais do que gostaríamos! "





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